O Daime, Caetano & Gil
Juarez Duarte Bomfim
L.E. Pomar Visual Blog
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Por Juarez Duarte Bomfim
O jornalista Carlos Marques, atualmente consultor da Unesco e residente em Paris, estava com 20 anos de idade quando a direção da revista Manchete decidiu destacá-lo, na companhia de um fotógrafo, para uma reportagem sobre a distante Rio Branco, capital do Acre, no ano de 1969. [1]
Entre os vários entrevistados, Marques conversou com o bispo italiano Giocondo Maria Grotti, que dois anos depois (1971) morreria durante acidente aéreo no município de Sena Madureira.
Ao ser perguntado sobre os problemas que enfrentava na região, o bispo reclamou da Doutrina do Santo Daime, fundada pelo negro maranhense Raimundo Irineu Serra.
Marques decidiu conhecer o Mestre Irineu Serra, que trabalhava no roçado de sua propriedade quando o jornalista foi visitá-lo.
- Aquele encontro foi a experiência mais marcante de minha vida. O mestre Raimundo disse que sabia que eu chegaria e estava me esperando. Disse o meu nome, que eu havia sido libertado recentemente da prisão e que eu tinha uma cicatriz na perna.
Marques contou, ainda, que passou três dias no Alto Santo e tomou Daime, mas não revela detalhes de sua experiência.
- Ele me disse que um dia eu voltaria ao Acre, mas jamais acreditei nessa possibilidade.
Quando se despediu do Mestre Irineu Serra, inusitadamente o mesmo lhe ofereceu uma garrafa de Daime com a recomendação para ele tomar o seu conteúdo com amigos sensíveis. [2]
De volta ao Rio de Janeiro, Carlos Marques entrega a garrafa e o seu conteúdo ao compositor tropicalista Gilberto Gil, a descrevendo como “uma beberagem indígena sagrada que produzia visões deslumbrantes e estados de alma elevadíssimos”. [3]
Naquele mesmo dia Gilberto Gil tomou uma dose da bebida, e logo após foi para o Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, pegar a ponte aérea para São Paulo.
Já no saguão do Aeroporto de Congonhas, São Paulo, onde ocorria a inauguração de uma exposição militar, da FAB - Força Aérea Brasileira - o efeito do Daime começou a se manifestar, e Gil “captara conteúdos indescritíveis na presença dos militares”. [4]
Era época de Ditadura Militar e a classe artística e intelectual brasileira estava sendo duramente perseguida, os próprios artistas baianos Gil e Caetano seriam logo após presos e “convidados” a se retirarem do Brasil.
Sob efeito do Daime Gilberto Gil sentiu glauberianamente “como se tivesse entendido o sentido último do momento de nosso sentido como povo, sob a opressão autoritária”.. . e mesmo sob o medo que então os militares provocavam.. . sentia que podia “amar, acima do temor e de suas convicções ou inclinações políticas, o mundo em suas manifestações todas, inclusive os militares opressores”. [5]
A mensagem crística chegava assim ao coração do artista, apesar de todas as perseguições e temores: “Amai a vossos inimigos”.[6] Era o Daime operando…
Depois dessa experiência solitária no vôo Rio-São Paulo, Gilberto Gil reúne um grupo de amigos no apartamento do compositor Caetano Veloso e propõe que todos fizessem uma “viagem” em conjunto. Seguindo a recomendação do Carlos Marques, Gil serve a cada um dos presentes pouco mais de meio copo.[7]
Conta Caetano: ” a beberagem espessa e amarelada tinha gosto de vômito, mas não me causou náuseas”.[8] A partir daí, a verve inspirada do poeta baiano transmite um interessantíssimo depoimento das visões e percepções do que via e sentia, da vida que percebia nos objetos inanimados, “a história de cada pedaço de matéria” de um prosaico carpete de náilon do seu apartamento, por exemplo…
Ao som do rock progressivo do Pink Floyd, no limite exíguo do vigésimo andar de um edifício paulistano, dá-se o experimento:
“Sandra (mulher de Gil) entrava e saia do quarto do som com os olhos duros e o rosto sério. Ela estava assustada. Eu a achava parecida com um índio. Gil estava com lágrimas nos olhos e falava alguma coisa sobre morrer, ter morrido, não sei. Dedé (mulher de Caetano) circulava pela sala dizendo que se via a si mesma em outro lugar. Eu fiquei muito feliz de observar que as pessoas eram tão nitidamente elas mesmas… Uns pontos de luz coloridos surgiram no espaço ilimitado da escuridão… Formas circulares eram compostas por lindos pontos luminosos dançantes. Aos poucos eu sabia quem era cada um desses pontos luminosos. E em breve eles de fato se mostravam como seres humanos. Eram muitos, de ambos os sexos, todos estavam nus e tinham aspecto de indianos. Essas pessoas dançavam em círculos de desenhos complicados, mas eu não só podia entender todas as sutilezas dessa complicação como tinha tranqüila capacidade de concentração para saber sobre cada uma das pessoas tanto quanto eu sei de mim mesmo ou de meus próximos mais amados”.[9]
É dito que da(s) experiência(s) com o Daime, particularmente experiências pico como esta, de Gilberto Gil (”Gil… falava alguma coisa sobre morrer, ter morrido”..) surgiram belíssimas canções do seu cancioneiro, tal como “Se eu quiser falar com Deus”.
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Thursday, May 29, 2008
Posted by Lou Gold at 1:01 PM 0 comments
Labels: Barquinha, Caetano Veloso, Carlos Marques, Gilberto Gil, Irineu Serra, Mestre Irineu, Santo Daime, União do Vegetal
Monday, May 26, 2008
WESAK NA LUA CHEIA
Para mim, um dos aspectos mais interessantes da religião do Santo Daime é seu prazer em celebrar os professores e ensinos de outras religiões. Céu da Lua Cheia, uma das muitas igrejas do Santo Daime na região de São Paulo, realiza anualmente um festival no "Wesak" para celebrar a vida e os ensinos de Buda.
Pessoas vem de perto e longe para cantar o hinário da Lua Cheia recebido pelo Padrinho Léo Artése
e para aprender com a sabedoria que nos foi passada por Buda, através da linhagem espiritual do Padrinho Sebastião
e de Mestre Irineu
e da força do Santo Daime.
Essa Força, essa Força
Essa Força tem o poder
De mostrar todos os mistérios
Do Universo prá você.
Viva Mestre Irineu!
Viva Padrinho Sebastião!
Viva Buddha!
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Posted by Lou Gold at 6:41 AM 2 comments
Tuesday, May 6, 2008
UMA VIAGEM AO CORACAO
Mestre Conselheiro Luíz Mendes do Nascimento
Eu tenho procurado uma forma de descrever as minhas experiencias no caminho do Santo Daime - com a familia e amigos de Luiz Mendes na Vila Fortaleza, Acre, durante minhas viagens pelo Brasil, e até hoje em dia, na minha mente, quando me sento de frente ao computador e escrevo neste blog, tão longe da floresta, no meio da gigantesca São Paulo.
Para mim, tem sido uma viagem para dentro do coração, assim como o desenvolvimento de uma disciplina para aprender a ficar lá dentro.
Apesar de adorar transmitir os aspectos de festa e alegria nos trabalhos espirituais do Santo Daime, eu quero destacar que estes são os resultados do ritual e de uma forte "corrente" de membros experientes. É necessário muita auto-disciplina e existem "passagens" difíceis para serem atravessadas. Como o padrinho Luiz Mendes costuma dizer, "para receber o presente, é necessário merecimento".
Talvez alguns videos do retiro de carnaval da Flor do Ceu possam dar uma pequena noção dessa viagem de disciplina para dentro de um coração aberto e amoroso. Na primeira noite de trabalhos na Flor do Ceu nos cantamos os hinos do Novo Horizonte, do padrinho Luiz Mendes.
Três deles estão abaixo.
O primeiro, Entrei numa Batalha, fala sobre a dificuldade de vencer a si mesmo - e não perder o amor no coração. Também fala sobre a compaixão de Deus e o milagre de São Francisco.
Estes "hinos de batalha" - focados no auto-controle e firmeza - normalmente têm ritmo de marcha militar e sao acompanhados de fogos de artificio. Eu não conheco uma explicação definitiva para os fogos, mas a versão mais aceita é a de que eles têm relação com os momentos de solidão dos seringueiros em suas viagens pela grande floresta. Eles sempre carregavam armas, disparando ocasionalmente tiros para "espantar os maus espiritos".
Como é dito em todos os caminhos espirituais, "o primeiro inimigo de uma pessoa procurando conhecimento é o medo". Eu posso imaginar Mestre Iirneu no começo de seus estudos com a ayahuasca, lutando para receber as mensagens da Rainha enquanto se cuidava dos perigos da floresta amazonica, e tendo que vencer os medos que emergem da "floresta da mente". Talvez por isso que ele tenha estabelecido os fogos em alguns hinos e a tradicao continuou.
O proximo hino, Ouvi o Som das Aguas, fala sobre o agradecimento ao primor de se receber as mais iluminadas mensagens e instrucoes no balanco de um trabalho espiritual forte e ter a esperança de coloca-las em pratica.
O esforço não é apenas para se alcançar as alturas do astral, mas também para enfrentar os desafios da vida na terra, como a destruicao da floresta. O proximo video mostra o Padrinho Luiz Mendes apresentando uma dramatizacao do espirito de Casmerim, uma entidade feminina que protege a floresta e que tem uma especial ligacao com a familia Mendes.
O video (abaixo) comeca com a ultima parte do hino que fala sobre a admiracao por este espirito, de como ela vai volta da casa do pai e de como ela sera sempre lembrada. Depois da execucao do hino, seu Luiz faz uma dramatizacao, trazendo as energias de casmerim para a cerimonia.
Como um defensor da floresta ha muito tempo, eu devo dizer que Casmerim toca o meu coracao profundamente.
Vamos agora para a noite final do retiro
A filosofia do Santo Daime afirma que a doutrina e coletiva, pertencente e recebida pela corrente espiritual, dai existir uma troca coletiva, com ofertas oriundas do passado e do presente. A noite final é o momento de compartilhar estas dadivas entre a irmandade. Talvez estes pequenos fragmentos possam retratar um pouco dessa experiencia que e a viagem ao coracao de todos.
O hino de Joaquim fala sobre o grande guerreiro do coracao, Mestre Irineu e a heranca que nos deixou da Amazonia. Houve um momento na mesa que revelou uma linda relacao de mae e filha, entre Debora e Carol, que teve um significado muito especial para mim.
Este foi o ultimo trabalho espiritual de Jacqueline na viagem com a comitiva de Luiz Mendes. Aqui esta o presente que ela nos deu.
O Retiro de Carnaval da Flor do Ceu do ano de 2008 terminou com todos cantando a oracao de Sao Francisco.
Viva São Francisco!
Viva a Harmonia!
Viva a Alegria!
Viva a Amizade!
Finalmente, eu gostaria de agradecer a Debora e Eduardo Gabrich por manter a maravilhosa Flor do Ceu, pelas suas varias contribuicoes ao movimento do Santo Daime, por espalharem a amizade e incentivo a tantas pessoas e por me fazerem sentir como se estivesse em casa.
Viva Eduardo e Débora!
Viva Mestre Conselheiro Luíz Mendes!
Viva Mestre Irineu!
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Posted by Lou Gold at 11:29 AM 0 comments